Museu da Patologia: centenário, visionário e resiliente
Imagina um museu que reúne centenas de milhares de exemplares de órgãos e tecidos humanos que ajudam a contar a história de doenças no Brasil e retratam pesquisas realizadas por expoentes da ciência nacional. E que ainda utiliza seu acervo para ensinar e encantar pessoas de todas as idades.
Esse é o Museu da Patologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que, em 2023, completa 120 anos de uma trajetória marcada pela inovação e resiliência em prol da pesquisa e do ensino em ciência. Com contribuições para a saúde nacional e internacional, o espaço foi idealizado pelo sanitarista Oswaldo Cruz, em 1903, a partir da conservação de amostras de órgãos analisados em necropsias para desvendar casos de febre amarela.
Da esquerda para direita: Laboratório de Bacteriologia criado em 1903 onde abrigou os primeiros exemplares do Museu de Anatomia Patológica. Pavilhão Mourisco onde o Museu foi transferido em 1918. Visita de Albert Einstein em 1925 pelo Castelo Mourisco com cientistas da Patologia. A Seção de Anatomia Patológica na década de 1940-1950, na foto aparece a Dra. Rita Cardoso, primeira mulher no comando do Museu. Emmanuel Dias no comando do posto Avançado de Bambuí a partir de 1943 e o coração utilizado para descrever a Cardiopatia Chagásica.
Fotos: Arquivo da Casa de Oswaldo Cruz e do Museu da Patologia.
O acervo revela o espírito visionário de Oswaldo e o pioneirismo da Patologia em Manguinhos, bairro do Rio de Janeiro que abriga a sede da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). “Embora sejam três coleções diferentes, possuem forte conexão entre si. Os acervos são diversificados, com material de vários países, mas, principalmente, com grande representatividade nacional. Essa diversidade pode se revelar ainda maior, considerando que estamos realizando o inventário dessas coleções”, destaca Barbara.
Período sombrio
Entre o final da década de 1960 e a década de 1970, durante a Ditadura Militar, o IOC atravessou um período sombrio, com a interrupção de pesquisas, o fechamento de laboratórios, perseguição a cientistas e a destruição de coleções biológicas, como a do Museu da Patologia.
As lâminas que restaram precisaram passar por um minucioso processo de restauração. Um dos membros da equipe era José de Carvalho Filho. Falecido em 2015, ele dedicou mais de 60 anos de trabalho no IOC. Por muito tempo foi o fotógrafo oficial do Instituto, sendo o responsável, inclusive, pelo registro fotográfico histórico da reintegração dos pesquisadores cassados pela ditadura
“As Coleções da Seção de Anatomia Patológica e a de Febre Amarela sofreram muito com o episódio conhecido como Massacre de Manguinhos. Exemplares e documentações foram perdidos ou sofreram com a deterioração”, relembra Barbara”. Fotos: Rodrigo Mexas.
Quando o Instituto foi reorganizado, na década de 1980, foi criado o Departamento de Patologia do IOC — que décadas mais tarde deu origem ao atual Laboratório de Medicina Experimental e Saúde, responsável pela guarda do Museu da Patologia. Foi então que em 1984 surgiu a caçula Coleção do Departamento de Patologia, acervo que ainda hoje recebe material de pesquisas. “Diferentemente das outras Coleções, que se concentram na patologia humana, essa trata da patologia experimental, estudando a indução artificial dos processos patológicos. O acervo continua em uma crescente como resultado do grande volume de material necessário para a realização de trabalhos científicos, monografias, dissertações e teses nas áreas de Patologia e Hematologia experimentais”, destaca Barbara
Popularização da ciência como principal vertente
Quem já teve a oportunidade de visitar eventos científicos que contaram com a participação do Museu da Patologia, provavelmente se encantou com a variedade de jogos e abordagens interativas promovidas pelo espaço.
“No início dos anos 2000, quando expressamos nosso interesse em participar desses eventos, havia um receio se teríamos sucesso por conta da estética das peças. Porém, percebemos que as crianças não se incomodavam em ver os órgãos conservados em formol. Pelo contrário, ficaram ainda mais curiosas”, relata Barbara.
Compilados de atividades de popularização científica com a participação do Museu da Patologia nos últimos 20 anos. Fotos: Gutemberg Brito e Museu da Patologia.
Resiliência como característica fundamental
Mais recentemente, outro duro episódio entrou para a história do Museu. No dia 30 de abril, um incêndio destruiu parte do acervo e do espaço que passava por obras para receber visitantes.“Estávamos na euforia de abrir o museu para o público quando o espaço foi atingido pelo incêndio. Tínhamos um planejamento estratégico de visibilidade que precisou ser adiado para que pudéssemos focar na recuperação do material afetado. Desde maio, estamos nesta força tarefa que se estenderá por 2024”, relata Barbara.
Recuperação das lâminas histopatológicas que passaram pelo incêndio no Pavilhão Lauro Travassos. Foto: Gutemberg Brito
Para a curadora, além da recuperação das peças atingidas pelo incêndio, o principal foco é conseguir um novo espaço que possa servir como sede para o museu. “A imagem que temos é que estávamos em um barco, navegando em direção a um destino. No entanto, o vento mudou e tivemos que ajustar as velas para ainda alcançar esse destino. Queremos abrir o museu para o público, fazer divulgação científica, encantar a sociedade e preservar o acervo da melhor maneira possível”, concluiu.
Adaptado de:
Vinicius Ferreira
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)